sábado, maio 26, 2007

Não te aflijas


(Flowers, Robert Mapplethorpe) 

Não te aflijas com a pétala que voa: também é ser, deixar de ser assim. 
Rosas verá, só de cinzas franzida, mortas, intactas pelo teu jardim.
 Eu deixo aroma até nos meus espinhos ao longe, o vento vai falando de mim.
 E por perder-me é que vão me lembrando, por desfolhar-me é que não tenho fim. 

 (c) Cecília Meireles

domingo, maio 13, 2007

Você não sabe...



Num apartamento perdido na cidade, alguém está tentando acreditar 
que as coisas vão melhorar ultimamente. 
A gente não consegue ficar indiferente debaixo desse céu 
No meu apartamento você não sabe o quanto voei, 
o quanto me aproximei de lá da Terra 
As luzes da cidade não chegam as estrelas sem antes me buscar. 
Na medida do impossível tá dando pra se viver. 
Na cidade de Lisboa, o amor é imprevisível como você e eu e o céu. 

(Rita Lee)

quinta-feira, maio 03, 2007

Patético



Desconheço o que o amanhã anunciará. Todavia continuo a enviar cartas patéticas. Porém não as escrever seria absurdo. Palavras e pensamentos encarcerados são um veneno oculto. Podem induzir um coma de antecipação. Resta-me apenas celebrar as minhas fraquezas. Já que meditar nas cogitações da vida é absolutamente fútil.

terça-feira, maio 01, 2007

Uma nódoa do passado...



Eu deixarei que morra em mim o desejo de amar seus olhos que são doces... 
Porque nada te poderei dar senão a mágoa de me veres eternamente exausto... 
No entanto a tua presença é qualquer coisa, como a luz e a vida... 
E eu sinto que em meu gesto existe o teu gesto... 
E em minha voz, a tua voz... 
Não te quero ter, pois em meu ser tudo estaria terminado... 
Quero só que surjas em mim como a fé nos desesperados... 
Para que eu possa levar uma gota de orvalho nesta terra amaldiçoada... 
Que ficou em minha carne como uma nódoa do passado... 
Eu deixarei...
Tu irás e encostarás tua face em outra face... 
Teus dedos enlaçarão outros dedos e tu desabrocharás para a madrugada... 
Mas tu não saberás que quem te colheu fui eu...
porque eu fui o grande íntimo da noite... 
Porque eu encostei minha face na face da noite e ouvi a tua fala amorosa... 
Porque os meus dedos enlaçaram os dedos da névoa suspensos no espaço 
E eu trouxe até mim a misteriosa essência do teu abandono desordenado. 
E eu ficarei só como os veleiros nos portos silenciosos 
Mas eu te possuirei mais que ninguém, porque poderei partir. 
E todas as lamentações do mar, do vento, do céu, das aves, das estrelas, serão a tua voz presente, tua voz ausente, a tua voz serenizada. 

 (Vinícius de Moraes in "Ausência")